Esse é um assunto polêmico, portanto acho melhor deixar claro alguns pontos antes de começar o texto.
- Eu não sou médico, sou nutricionista.
- Minha intenção não é indicar ou contra-indicar qualquer tipo de medicamento nesse texto, mas sim trazer algumas reflexões que acho interessante para as pessoas não-médicas fazerem.
- Nutricionista nenhum pode prescrever medicamentos, isso é proibido.
- Os profissionais da alimentação devem saber como eles funcionam e qual o impacto que isso tem na alimentação, corpo e saúde geral da pessoa.
- Embora só os médicos possam prescrever medicamentos, esse é um assunto que diz respeito a todas as pessoas da sociedade.
- O foco do texto é o uso desses medicamentos para emagrecer.
Por que estamos falando disso?
Em outubro de 2011 alguns medicamentos para “controle de peso” e “inibir o apetite” foram impedidos de serem comercializados no Brasil e outros sofreram um ajuste de prescrição mais rigoso: anfetamínicos (anfepramona, femproporex e manzidol) e sibutramina, respectivamente.
O motivo de a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) “com base em estudos internacionais que constataram a baixa eficácia desses medicamentos na perda de peso e riscos à segurança do paciente”, especificamente “os riscos à saúde oferecidos por esses remédios, como problemas cardíacos e alterações no sistema nervoso central, superam o benefício da perda de peso” ¹. Percebam que as pessoas que participaram desse veto não eram size friendly, mas mesmo assim reconheciam riscos importantes.
Nesse meio tempo esses medicamentos continuavam sendo usados ilicitamente, algumas vezes por pessoas que decidiam tomar elas por conta própria e compravam no “mercado negro”. Outras vezes prescrito por médicos, infelizmente. Eu já era nutricionista nessa época e atendi inúmeras pessoas que fizeram uso desses medicamentos nesse período.
Nesse mês (Junho/2017) esse medicamentos voltaram a ser permitidos no Brasil e isso gerou uma série de debates² . Muitas associações médicas se mostram contra a proibição dessas medicações desde o início.¹
É importante salientar que quem proibiu em 2011 foi a ANVISA e quem liberou em 2017 foi um projeto lei sancionado pelo presidente em exercício. A ANVISA ainda permanece contra e afirma que esse projeto é inconstitucional³.
A primeira questão aqui é: o quanto o Congresso tem de capacidade técnica para decidir se uma substância é mais ou menos danosa à saúde?
Segunda questão é: será que não pode ter rolado uma pressão de algumas indústrias farmacêuticas (que possivelmente financiam campanhas ou fazer acordos políticos com atuais representantes do congresso) para que esses medicamentos fossem novamente liberados, logo para serem prescritos, para a galera ganhar mais dinheiro com consultas e prescrição de remédios?
Terceira questão: as substâncias são as mesmas e o nosso corpo é o mesmo, o que fez essas substâncias serem consideradas perigosas em 2011 aqui no Brasil e 2017 não mais? (PS: Algumas dessas medicações são proibidas há quase 20 anos na Europa e nos Estados Unidos²)
Você pode e deve questionar sobre alguma medicação que está sendo prescrita
Muitos profissionais não gostam de serem questionados, mas o próprio Conselho Federal de Medicina diz que essa lei “respeita a automia dos médicos e dos pacientes na escolha de procedimentos terapêuticos ‘reconhecidos e válidos’”.³
Vamos fazer valer esse direito? Converse com o médico: eu quero saber mais sobre esse medicamento; eu não quero tomar isso; eu prefiro não usar essa medicação; etc.
E se você não se sentir confiante, procure uma segunda opinião. Ou terceira, ou quarta… Até que você fique satisfeitx com o que foi acordado com você.
Cuidado com as “fórmulas”
Fique atentx principalmente quando o assunto for fórmula manipulada. Não é comum ler ou perguntar o que tem nas fórmulas, mas é preciso.
Mesmo se você não for ao médico para emagrecer, às vezes fica “implícito” pelo fato de ser gordx, que aquilo é necessário ou que você deseja.
Procure saber os efeitos colaterais
Leia a bula. Fomente discussões em fóruns. Converse com pessoas que já usaram pra decidir se você topa ou não o que vem junto do uso desses medicamentos. Alguns efeitos colaterais comuns das anfetaminas são taquicardia (sensação do coração batendo rápido, sentir que ele vai sair pela boca), agitação, insônia, transtornos psiquiátricos, elevação da pressão arterial, etc.
Minha experiência, enquanto nutricionista
O que eu posso falar do que acompanhei dos meus pacientes ao longo desses quase 10 anos, durante o uso de algumas dessas medicações e muitos após anos de parar de usar com o intuito de emagrecer.
Sim, eles emagrecem e muito rápido. Porém a pessoa reganha esse peso na mesma velocidade quando interrompe o tratamento. E o uso da segunda vez nunca produz o mesmo efeito (em termos de emagrecimento), assim como o terceiro e assim por diante.
Algumas pessoas desenvoveram ou potencializaram quadros psiquiátricos (depressão, síndrome do pânico, etc) após alguns meses ou anos da interrupção do uso desses medicamentos.
Muitos amigos médicos me disseram que esses casos são de pessoas que fizeram um uso incorreto da medicação. Isso eu não posso afirmar sobre quem eu acompanhei. Mas eu nunca atendi uma única pessoa que tenha emagrecido e mantido o peso com essas medicações que foram aprovadas. Não significa que elas não existam, mas a maioria foi como eu descrevi acima (fiz um cálculo mental rápido e só nos ultimos 6 anos eu atendi um total de aproximadamente 5 mil pessoas – apenas algumas usavam ou tinham usado essas medicações).
O desejo de emagrecer pode ser sedutor, mas fiquem atentxs para o que esse pacote trará para sua vida, não apenas hoje, mas amanhã, o mês que vem e o ano que vem. O corpo é seu, a saúde também.
¹ http://www.brasil.gov.br/saude/2011/10/anvisa-decide-banir-emagrecedores-a-base-de-anfetaminas-mas-libera-sibutramina
² http://portal.anvisa.gov.br/noticias/-/asset_publisher/FXrpx9qY7FbU/content/sibutramina-e-remedios-para-emagrecer-entenda/219201/pop_up?_101_INSTANCE_FXrpx9qY7FbU_viewMode=print&_101_INSTANCE_FXrpx9qY7FbU_languageId=pt_BR
³ http://www.farmaceuticas.com.br/presidente-em-exercicio-sanciona-lei-para-liberacao-de-anorexigenos-mas-anvisa-afirma-que-e-inconstitucional