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22.03.18

Gordofobia é opressão, e eu posso provar

Gordofobia – a grande maioria das pessoas que possuem acesso à televisão ou internet já teve contato com esse conceito em algum momento, mesmo que não tenha prestado atenção. O gordoativismo vem aos poucos se articulando no Brasil e adquirindo visibilidade, mas por ser um movimento ainda em construção suas reivindicações e pautas não tiveram décadas de consolidação e aperfeiçoamento, de forma que muitas das pessoas que já ouviram falar na luta dos corpos gordos não sabem exatamente quais são nossas demandas.

Isso gera aquela confusão que estamos cansados de ouvir: A ideia de que nós lutamos pelo direito de sermos considerados bonitos. Consequência disso é a frase “gordofobia não existe”, palanque daqueles partem de uma informação errada e buscam diminuir a importância política do movimento.

Gordofobia vai muito além da estética, e para auxiliar na argumentação com as pessoas que questionam sua existência, eu reuni os fatos básicos na hora de provar que essa opressão existe e é tão real quanto machismo, racismo e LGBTfobia.

Em primeiro lugar, podemos dizer que existe “opressão” quando um determinado grupo coletivo de pessoas é institucionalmente privado dos direitos básicos e constitucionais dos cidadãos, quando existe um sistema que exclui e violenta esses grupos. Isso recai na construção de hierarquias sociais, em que um grupo adquire poder sobre o outro por deter acesso os direitos que outros não têm – e que assim se tornam privilégios. Essa opressão faz uso de estigmas que desumanizam o grupo com base na palavra de autoridades que tentam justificar essas agressões. É opressão, por exemplo, não permitir que uma mulher realize aborto em vista de uma gravidez indesejada, mas não prever nenhuma punição ao homem que escolhe abandonar esse filho antes mesmo de nascer.

Dito isso, precisamos estabelecer que o conceito de gordofobia presente no senso comum realmente não preenche os “requisitos” para se tornar uma opressão, pois ela é diariamente confundida com pressão estética. Explicando: Pressão estética é a imposição social que exige das mulheres perfeição física. Ela atua no campo individual, causa sofrimento psicológico e não pode ser mensurada.

Gordofobia não tem nada a ver com pressão estética, pois é uma violência que atinge um GRUPO de pessoas e lida com restrição de direitos básicos, e não com sofrimento pessoal. Ela atinge TODAS as pessoas gordas – mesmo que se achem lindas, mesmo que não sofram por serem gordas, mesmo que nem saibam o que essa palavra significa.

 

gordofobia existe

Por que, então, gordofobia é uma opressão? Porque ela retira das pessoas o direito ao atendimento médico no SUS, a uma disputa justa por vagas de emprego, ao uso dos transportes públicos e privados, à permanência em centenas de locais de convívio social.

A opressão dos corpos gordos na saúde fica clara quando os assentos, macas, leitos, cadeiras de rodas e equipamentos dos hospitais possuem limites de peso insuficientes. Quando uma pessoa gorda é negligenciada por seus médicos, tendo em vista apenas seu peso e as doenças que não tem, e por isso não recebe acompanhamento e tratamento adequados. Quando remédios emagrecedores e cirurgias eletivas são prescritos diariamente, apesar de todos os seus absurdos efeitos colaterais, porque ser magro “vale o sacrifício”.

 

 

gordofobia existe

Também são oprimidos os corpos gordos quando sete em cada dez empresários brasileiros os discriminam em seleções de emprego, mesmo que isso seja inconstitucional. Quando precisam “compensar” sua forma com currículos extensos, porque o setor popular que mais emprega no Brasil é o que menos contrata pessoas gordas. Quando vencem a tal “meritocracia” e passam em concursos públicos, mas tem suas vagas ameaçadas por testes de aptidão que utilizam uma medida de saúde obsoleta.

Quando se trata do direito de ir, vir e permanecer, também vemos opressão aos corpos gordos. Fazem dos assentos grandes inimigos, pois ônibus, trens, aviões, salas de aula, salas de cinema, bares, restaurantes fazem questão de não comportar corpos maiores. Se precisarem utilizar o transporte público, são humilhados por catracas que entalam e geram hematomas. As pessoas em cadeiras de rodas entendem – os banheiros e portas do dia a dia não foram feitos para comportarem corpos diferentes. Enquanto pessoas de manequim 44 sentem dificuldade em escolher uma peça de roupa diante de tantas opções, aquelas que vestem 60 contam nos dedos as lojas em que conseguem achar peças que sirvam.

 

Digo com extrema sinceridade que gostaria muito que meu problema fosse apenas beleza. Gostaria muito que, ao sair de casa de manhã, a qualidade do meu look fosse a maior preocupação na minha cabeça, mas infelizmente não é. Eu estou preocupada com o preparo psicológico para a negligência médica que vou sofrer semana que vem, com as dores de assistir uma aula sentada em uma cadeira que não me cabe, com o trabalho extra que vou ter para provar ao meu chefe que não sou preguiçosa e desleixada como ele espera que eu seja, com a minha bolsa que ficará no corredor do banheiro público pois não cabe junto comigo dentro do box.

Beleza e autoestima poderiam ser os maiores problemas que pessoas gordas enfrentam, mas não são. A patologização é. A estigmatização é. A retirada dos direitos de ir, vir e permanecer; de atendimento médico decente; de possibilidade de sustento financeiro; a retirada do direito ao respeito é o nosso problema.

E não é só isso: A patologização e estigmatização dos nossos corpos é diária e ferrenha, justificada por autoridades fraudulentas, e esse assunto é longo demais para ser conversado em apenas um post – por isso eu fiz um vídeo. Eu e a Carine Martins rebatemos algumas pessoas que não acreditam na existência da gordofobia e provamos que ela existe, e precisa ser combatida.

 

 

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